sexta-feira, 8 de maio de 2009

Pesach Sheni – A Segunda Páscoa

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Pesach Sheni – A Segunda Páscoa

Constantino, o primeiro Imperador cristão, escreveu, numa mensagem ao clero presente no I Concílio de Niceia em 325 a.D. que os judeus "...não possuem a verdade na questão da Páscoa, porque, em sua cegueira ... ... frequentemente celebram duas Páscoas no mesmo ano." Pois bem, o que dizer desta afirmação? Simplesmente... que está correcta! No entanto, expliquêmo-nos melhor, já que a conclusão de Constantino não é tão linear quanto parece...
Como ponto de partida, eis um aspecto muito importante a considerar: a segunda Páscoa, ou Pesach Sheni, não é fruto de invenções da religião hebraica, nem é um ritual infundado, nem nasceu da tradição popular. Por outras palavras, os judeus, eles mesmos, não são responsáveis pela sua existência. Como surge então? Muito simples: foi Deus quem fez essa promulgação! A "segunda" Páscoa foi instituída por Deus, da mesma forma que Ele também instituiu "A" Páscoa!!!
De seguida, faremos a prova de tal afirmação. Mas antes, vamos enquadrar os factos. Tudo teve o seu início quando Israel, já livre da servidão do Egipto, em pleno deserto há um ano, se preparava para celebrar a sua redenção como povo, a libertação, a Páscoa. Deus deu, então, mais orientações para o povo. Mas, deixemos a Bíblia falar:
"E falou o SENHOR a Moisés no deserto do Sinai, no segundo ano da sua saída da terra do Egipto, no primeiro mês, dizendo: Que os filhos de Israel celebrem a Páscoa a seu tempo determinado. No dia catorze deste mês, pela tarde, a seu tempo determinado a celebrareis; segundo todos os seus estatutos e segundo todos os seus ritos, a celebrareis. Disse, pois, Moisés aos filhos de Israel que celebrassem a Páscoa. Então, celebraram a Páscoa no dia catorze do primeiro mês, pela tarde, no deserto do Sinai; conforme tudo o que o SENHOR ordenara a Moisés, assim fizeram os filhos de Israel." (Números 9:1-5)
Vemos, então, que todos os requisitos para a celebração pascal estavam a ser cumpridos pelo povo. Era a sua primeira celebração no deserto, e as determinações divinas estavam bem frescas na memória colectiva. O povo fortalecia-se. Muitos nasciam no caminho, mas a morte também não deixava de trabalhar. Na sua ceifa incessante de vidas humanas, muitos israelitas, parentes ou amigos dos que partiam, tinham-se tornado ritualmente impuros pelo contacto com esses corpos que partiam para sempre, a ponto de não poderem obedecer aos preceitos da grande festa, ou sequer de estarem presentes.
"E houve alguns que estavam imundos pelo corpo de um homem morto; e no mesmo dia não podiam celebrar a Páscoa; pelo que se chegaram perante Moisés e perante Araão aquele mesmo dia. E aqueles homens disseram-lhe: Imundos estamos nós pelo corpo de um homem morto; por que seríamos privados de oferecer a oferta do SENHOR a seu tempo determinado no meio dos filhos de Israel? E disse-lhes Moisés: Esperai, e ouvirei o que o SENHOR vos ordenará." (Números 9:6-8)
A tristeza e a frustração invadiu muita gente. Afinal, a festa da Páscoa acontecia somente uma vez por ano, e, era precisamente nessa altura que ficavam impossibilitados de a celebrar. Pior que tudo, havia a consciência de que tal acontecia sem que eles pudessem ter controlo sobre as circunstâncias. Que fazer então? Sabiamente, Moisés deixou que Deus dissesse como haviam de agir:
"Então, falou o SENHOR a Moisés, dizendo: Fala aos filhos de Israel, dizendo: Quando alguém entre vós ou entre as vossas gerações for imundo por corpo morto ou se acharem jornada longe de vós, contudo, ainda celebrará a Páscoa ao SENHOR. No segundo mês, no dia catorze, de tarde, a celebrarão: Com pães asmos e ervas amargas a comerão. Dela nada deixarão até à manhã e dela não quebrarão osso algum; segundo todo o estatuto da Páscoa, a celebrarão." (Números 9:9-12)
A solução divina não se fez esperar. Quem estivesse impossibilitado de celebrar a Páscoa por causa de uma questão de impureza ritual, ou porque não tinha conseguido chegar ao local de celebração no tempo prescrito, tinha uma segunda oportunidade para o fazer: num mesmo dia 14 do mês, também ao crepúsculo, mas no segundo mês do ano, e não no primeiro. Esta era a grande mudança: Para as pessoas que estavam naquelas circunstâncias, Deus mantinha inalterada a forma de celebrar a Páscoa, todos os requisitos enunciados no Egipto se mantinham, mas a festa avançava 1 mês.
Ora, isto muda a retórica de Constantino. Há aqui um aspecto crucial: quem tinha assistido ao primeiro evento, quem tinha estado presente no primeiro mês do ano, no 14 de Abibe, não repetia a sua celebração. Sendo assim, a afirmação do Imperador peca pela falta de precisão (ou conhecimento?): um judeu não celebrava duas Páscoas. Ele tinha, isso sim, a oportunidade de o fazer noutra data, divinamente estabelecida, se a impossibilidade não decorresse de desleixo ou falta de zelo. Era precisamente esse factor, a falta de zelo, que, pelo contrário, era fortemente punido por Deus:
"Porém, quando um homem for limpo, e não estiver de caminho, e deixar de celebrar a Páscoa, tal alma do seu povo será extirpada; porquanto não ofereceu a oferta do SENHOR a seu tempo determinado; tal homem levará o seu pecado. E, quando um estrangeiro peregrinar entre vós e também celebrar a Páscoa ao SENHOR, segundo o estatuto da Páscoa e segundo o seu rito, assim a celebrará; um mesmo estatuto haverá para vós, assim para o estrangeiro como para o natural da terra." (Números 9:13-14)

Ezequias e o "milagre" da segunda oportunidade
A Páscoa era, para os judeus, um encontro com Deus. O próprio Senhor exigia do Seu povo (Êxodo 34:18-26; Lev. 23:4-21; 33-44; Deut. 16:1-17) que viesse às festas, que não aparecesse de mãos vazias, e que viesse com espírito de agradecimento. Nesse contexto, a "segunda Páscoa" era, obviamente, a "segunda oportunidade" para o fazer. Mais do que isso, era a oportunidade para não perder a oportunidade. Pesach Sheni é inclusão, é encontro, é corpo, é aliança.
Ezequias foi um dos maiores reformadores de Israel. Quando subiu ao poder, o Templo estava fechado e servia como armazém. Os levitas estavam espalhados pelo país, cuidando dos seus próprios interesses, e tinham abandonado a sua vocação por falta de meios de subsistência. Entre os sacerdotes grassava a indiferença. Os homens, religiosos ou não, estavam longe de Deus, muito pelo exemplo que vinha do trono. Após ter limpo, purificado, consagrado e reaberto a Casa de Deus, (II Crónicas 29), Ezequias estava determinado em levar o povo a encontrar-se com Ele. Pelo facto de os sacerdotes não estarem santificados em número suficiente, a Páscoa não pôde ser celebrada no devido tempo (II Crónicas 230:1-3). Então, usaram o tempo da "segunda oportunidade", celebrando-a um mês depois (cap. 30). E a afluência foi enorme (vv.12,13). Mais do que isso, a segunda oportunidade gerou um sentimento de vergonha entre os religiosos, uma grande vontade de renovar alianças com Deus, de emendar o caminho, de retomar os compromissos abandonados (vv. 15-17).

Como cristãos, acreditamos numa realidade da Páscoa diferente desta. A nossa Páscoa não se rege por estes factores da "primeira aliança", porque entendemos ter já avançado para uma "aliança nova" em Cristo – Ele sim, a nossa Páscoa – (I Coríntios 5:7b), entendimento que os judeus não subscrevem. Os "Constantinos" modernos continuam a existir e a pregar, e a tentar desviar a nossa atenção daquilo que realmente é importante (por despeito e por desconhecimento). Daí que tenhamos de estar atentos, e a não nos deixar prender por manobras de diversão. Por isso, a boa notícia é que, pela própria natureza de Deus, o Seu cuidado para com o homem não tem fim. Os princípios de Deus, eternos e universais, cercam-nos e estarão sempre presentes à nossa volta, e é neles que nos devemos concentrar e focar os nossos olhos. Acreditamos num Deus que concede segundas oportunidades, e que, da mesma forma que o foi para Israel, Ele continua a querer ser encontro e aliança. O nosso coração, uma espécie de bússola que aponta para a direcção da "nossa verdade", está constantemente a ser monitorizado pelo Deus, que avalia as nossas intenções e os nossos propósitos. De vez em quando, quando nos afastamos da Sua verdade, a que vale, Ele tem de nos conceder uma segunda oportunidade, umas vezes por pura misericórdia, outras vezes para gerar em nós sentimentos de renovação (quiçá de vergonha), como aconteceu com os sacerdotes de Israel. De uma forma ou doutra, a Sua intenção é que caminhemos à Sua vista, bem junto d’Ele, o único lugar onde estamos defendidos dos outros e de nós mesmos.

Eduardo Fidalgo
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1 comentário:

Oren disse...

“Sonda-me ó D-us, e conhece o meu coração, prova-me e conhece os meus pensamentos; vê se há em mim algum caminho mau e guia-me pelo caminho eterno” (Salmo 139:23-24).

Desde o início, D-us é gracioso. Antes do estabelecimento da aliança da lei com Moshe (Moisés), D-us foi gracioso com Avraham (Abraão).

Pesach sheni mostra-nos um D-us de carácter constante, equilibrado e imutável. Justo, Recto, Santo, Misericordioso, Gracioso, Amoroso e Tardio em irar-se.

Aba Pai, compreendes as nossas fraquezas, conheces a nossa estrutura, e dás-nos a oportunidade de endireitarmos os nossos caminhos e voltar para Ti.

Usufruamos da graça contínua de D-us, por intermédio de Yeshua, Seu Filho, a nossa Pesach.